quinta-feira, 15 de setembro de 2011

O "Palacete do Pena" - Espinho


 
Esta reportagem foi mais uma ruinosa aventura na boa cãopanhia do Edgar, e na melhor companhia do Marcos Oliveira, um novo amigalhaço que partilha além deste gosto por ruínas, uma grande paixão por fotografia e arquitectura... foi uma manhã e pêras... havemos de repetir.
 
Costuma-se dizer que todas as rosas têm espinhos... neste caso é Espinho que têm uma Rosa... e é Pena o estado em que se encontra...

Há já algum tempo que planeava visitar este mal amado edifício, pois a sua ruinosa fama  ecoa na internet, colocando Espinho numa situação rocambolesca...
Esta casa já deveria ter sido classificada e expropriada pela autarquia, em vez de permitir a sua degradação por especulação imobiliária pela parte dos actuais proprietários.
Espinho, até ter sido eleito como estância de Verão da alta burguesia nortenha, era apenas uma pequena localidade piscatória da qual pouco deve restar...
Por outras palavras, todo e o melhor património arquitectónico é muito recente, logo, a melhor pérola desta cidade deveria ser protegida com cuidados redobrados ...
Se considerarmos que esta autarquia é um exemplo de dinamização cultural e o seu ambiente urbano destaca-a pela qualidade entre as maiores cidades, torna-se difícil de compreender como se tolera esta situação de lesa património...
Por muito bom que seja o ambiente urbano (e é) nesta linda cidade , o chalet Rosa Pena ofusca todos os outros atractivos que esta localidade tem para oferecer... senão vejamos...
Foi em Espinho que viveu Eça de Queiroz, o que corrobora que este local foi e ainda é um retiro de elites culturais.
Espinho tem um dos melhores núcleos de arquitectura de veraneio de Portugal, que rivaliza com a costa do Estoril sem nada lhe ficar a dever...
É nesta terra que  semanalmente se realiza a maior feira do País,  além de acontecerem em Espinho vários eventos culturais...
O Festival Cinanima que é um importante acontecimento no cinema de animação e coloca esta cidade no mapa mundial.
Aqui também se celebra um festival musical, organizado pela Academia de Música e pela  Câmara Municipal desta cidade, há também anualmente um  encontro de homens estátua...
É conhecido o Casino de Espinho, que além de casa de jogo é uma das maiores atracções  desta zona, que gera fortunas (e ruínas) diariamente...
Espinho tem também  um Centro Multimeios com um planetário e uma biblioteca dedicada a este fascinante tema...
Enfim, Espinho tem e terá muito mais para contar,  mas eu e muitos de nós, começámos por conhecer Espinho pela ruína deste lindo chalet!!!
 
Trata-se do chalet Rosa Pena, comummente conhecido como palacete do mesmo nome.
Embora por uma questão de estilo não lhe caiba esse epíteto, a sua volumetria e cuidada traça justifica-o em pleno e faz corar de inveja muitos palacetes.
A sua imponente fachada é ricamente ilustrada por pormenores de arquitectura e elementos de arte nova com esmerados acabamentos nas cantarias. Os frisos e painéis de azulejos, os alpendres, os corpos entrantes e reentrantes, a torre, os ferros forjados do portão, os estuques e frescos, tornam este edifício num tesouro arquitectónico que se distingue pela riqueza  e simplicidade...
Foi construído em 1928 por encomenda de Joaquim Alves Pena e o projecto é atribuído ao seu sogro, o Engº José Alves Pereira da Silva, casado com Rosa Pena da Silva que NUNCA foram proprietários deste edifício, mas que  acabaram por erradamente o baptizar , o seu verdadeiro nome é Palacete do Pena ...
Este engenheiro não seguiu o verdadeiro "caderno de encargos" que era bem mais simples e  terá exagerado no projecto, que suspeito ter um toque ou inspiração de António Rigaud Nogueira, pela semelhança que há entre outras residências da sua autoria nesta região.
Joaquim Alves Pena era um abastado fazendeiro de café no estado de S. Paulo, Brasil, e era casado com Maria de Lurdes, filha do casal José A. Pereira da Silva e Rosa Pena.
Maria de Lourdes Pena, quando enviuvou, voltou a Portugal para vender os seus bens, tendo nessa altura mudado o chalet de mãos e desde então mudaram também os seus tempos de glória...
Chegou ali a funcionar nos anos oitenta, um núcleo de apoio ao ciclo preparatório. Depois o município tentou adquiri-lo, mas o proprietário por especulação imobiliária pediu uma soma exorbitante, o que inviabilizou o projecto de reabilitação...
O  acesso é livre e o seu estado de conservação já passou dos limites do sustentável, ameaçando derrocar a qualquer momento. É um  local frequentado por indigentes, delinquentes e fotógrafos, o que  torna ainda mais perigosa esta ruína...
É urgente uma vez mais, que haja alguém que aja!!! Somos cúmplices quando ficamos impávidos e impotentes perante uma situação, em que alguém por puro egoísmo conduz toda uma cidade à ruína ...


Links relacionados
http://pt.wikipedia.org/wiki/Espinho_%28Portugal%29


http://5minutosdearte.blogspot.com/2011/08/palacete-rosa-pena-espinho.html

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Convento de Almiara / Mosteiro de Verride

A descoberta deste monumental mosteiro, foi para mim uma surpresa proporcional ao seu tamanho, não só pela imponência e pelas memórias, como também pelo seu estado de conservação.
Está situado em Verride, a poucos quilómetros de Montemor-o-Velho e a sua história é bem longínqua. 
O terreno foi doado em 1194 por Afonso Geraldes e sua mulher, Belide Soares, a frades regrantes do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, que foram os responsáveis pela sua edificação.
Foi idealizado para o descanso e recreio dos frades desta ordem, era como uma colónia de férias para estes homens de Deus, que ali nas margens do rio Mondego passavam o Verão. Foram também os frades que introduziram na região o cultivo de arroz, cultura que ainda hoje ali perdura...
O Mosteiro de Verride terá entretanto mudado de mãos e foi vendido aos monges da ordem de Santana, sendo novamente  vendido aos monges de Santa Cruz em 1285 e que o ocuparam até 1834.
Da estrutura arquitectónica primitiva e da sua índole medieval pouco ou nada resta. O mosteiro sofreu intervenções em 1580, e mais tarde durante os séculos XVII e XVIII foi acrescentado o torreão e remodelada a capela, conjugando elementos de arquitectura dos períodos  barroco e neoclássico. 
 
O seu interior era ricamente decorado com painéis de azulejos e o chão era revestido a pedra mármore, hoje quase desaparecidos pela espoliação continuada levada a cabo por gatunos sem escrúpulos, todo o estado de conservação inspira cuidados e necessita urgentemente de uma profunda intervenção para evitar uma derrocada.
A sua ampla fachada pombalina é quase simétrica e adornada ao meio por uma varanda sustentada por quatro colunas com um frontão neoclássico e o corpo esquerdo é arrematado por um torreão, já o corpo direito está completamente derrocado no primeiro andar , a falta do torreão leva-nos a crer que o projecto ficou inacabado.
Já dentro do mosteiro, tendo-me introduzido pelas cavalariças impregnadas de um ambiente nostálgico, onde há ainda vestígios da vida monástica e rural, o ambiente quase nos faz regredir aos seus gloriosos tempos. Ao fundo deste espaço há umas velhas escadas que nos conduzem  por aí ao primeiro andar.
Com o vislumbre de um corredor ladeado pelas espartanas celas dos monges e abrindo-se ao fundo uma ampla sala iluminada por uma LUZ divina cheguei ao torreão. O cenário que encontrei é um misto de magnificência com desolação, todos os lambris de azulejos, tal como o chão foram selvaticamente rapinados, deixando como testemunha um magnífico fresco barroco final datado de 1755, representando as armas de Portugal e da ordem de Santa Cruz de Coimbra, ladeados por dois harmoniosos "putis" que quase  ainda fazem ecoar naquelas paredes as suas douradas trombetas. Há também nesta sala uma curiosa porta pintada em "tromp l'oeil" em relativo bom estado... 
Segui o meu caminho na demanda da capela, que seria certamente a parte mais rica deste mosteiro, depois de recuar o corredor encontrei mais uma ala derrocada que nos leva por outro corredor a outra sala e ao coro alto... uma vez mais é desolador o cenário... todo o espólio desta capela desapareceu com requintes de vandalismo, sobrando apenas vestígios do retábulo e alguns restos de painéis de azulejos que ilustravam a vida neste mosteiro.
No andar inferior do corpo direito deste edifício,  temos o "acesso" para o inexpugnável claustro que pela invasão de silvas e outros agressivos elementos  não pude sequer fotografar... mais à frente, mais um corredor, mais desoladoras alas habitadas por morcegos...
 
Há ainda neste mosteiro uma curiosa estrutura circular igualmente vedada por silvas, que creio ser um poço e ostenta numa cantaria a data de 1580,  mas só poderia ter apurado essa dúvida se tivesse uma catana e disposição para desbravar mato... mas vou tentar saber...
Tal como muitos outros monumentos eclesiásticos, este também foi condenado à ruína quando foram extintas as ordens religiosas. O decreto de 30 de Maio de 1834 foi uma das maiores injustiças da história da nação!!!
Após a guerra liberal e aquando a convenção de Évora Monte, em que foi assinada a capitulação de D. Miguel, uma das primeiras medidas apresentadas a D. Pedro IV pelo novo governo de Duque da Terceira e pela mão de Joaquim António de Aguiar, ministro das pastas da Justiça e dos Negócios Eclesiásticos, foi a extinção das ordens religiosas masculinas.
Dirigindo-se ao novo Rei proferindo as seguintes palavras «Senhor: Está hoje extinto o prejuízo que durou séculos, de que a existência das Ordens Regulares é indispensável à Religião Católica e útil ao Estado, e a opinião dominante é que a Religião nada lucra com elas, e que a sua conservação não é compatível com a civilização e luzes do século, e com a organização política que convém aos povos»... o que lhe valeu a alcunha de "Mata Frades" além de ter enterrado ainda mais a nação...
Este malfadado decreto  impunha  a imediata extinção de todas as casas religiosas (art.1) e a incorporação dos seus bens na Fazenda Nacional (art.2), à excepção dos vasos sagrados e paramentos que seriam atribuídos aos ordinários das dioceses (art.3).
Segundo a descrição de uma testemunha, “muitos religiosos saíram cobertos com mantas e descalços; os próprios doentes e paralíticos tiveram que abandonar o leito das enfermarias”.
O artigo 3 do decreto afirmava que seria concedida uma pensão anual aos religiosos que não obtivessem benefício ou emprego público” mas a promessa das pensões “não passou de irrisão”. Alguns anos depois, Alexandre Herculano insurgiu a sua voz a favor destes “desgraçados” e implorava “pão para metade dos nossos sábios, dos nossos homens virtuosos, dos nossos sacerdotes que morriam de fome e frio”.
  
Essa impopular medida iria supostamente pagar as dívidas do estado que se encontrava completamente depauperado. Uma vez que o povo não aguentava mais cargas fiscais por estar à beira da miséria, restavam as ordens religiosas e o seu imenso património para pagar essa pesada factura da dívida pública e externa... e quando o mar bate na rocha... coitado do mexilhão!!!
O cenário económico e social infelizmente não nos é difícil de imaginar, conforme se pode constatar pelas contas públicas dos dias de hoje, no entanto a situação de então deveria ser muito mais difícil, senão vejamos...
Depois de termos sofrido as agruras de três invasões francesas e de todas as consequências que se possam contabilizar deste triste episódio, vimos rumar para o Brasil as nossas maiores riquezas e rendimentos. Como dois males nunca vêm só, ainda tivemos de suportar um governo autoritário inglês durante dez anos que nos sugou até ao tutano...
Após tudo isso vem uma guerra civil entre dois gananciosos irmãos, que em nome do patriotismo e dos melhores valores que se possam defender, devastaram famílias inteiras, povoações e cidades... este país à beira mar abandonado virou um caos total... não havia indústria, estradas, agricultura e tudo o mais que pudesse funcionar ou impulsionar a nossa economia, todo o nosso império sofreu graves mazelas que nos deixaram profundas cicatrizes...
Quando o caos é total e como bem sabemos, os nossos messiânicos governantes apresentam-nos medidas políticas geniais que supostamente nos salvarão e reconduzirão à prometida glória... no entanto é raro conseguirem prever com alguma exactidão as repercussões e proporções que essas medidas têm a médio e longo prazo...
Uma lei que iria dar a oportunidade aos pequenos agricultores adquirirem um talhão de terra e serem independentes, apenas beneficiou alguns abastados investidores que aproveitaram os  monumentos a preço de "uva mijona" como investimentos imobiliários, pois os pequenos agricultores estavam tão depauperados que não tiveram poder de compra, além da maioria dos camponeses terem perdido o emprego nos mosteiros que lhes davam trabalho...
Assim ficaram abandonados muitos mosteiros por este país fora com prejuízo para todos nós... isto para não falar dos milhares de homens que sempre trabalharam e se devotaram a uma santa causa, que de um momento para outro passaram a mendigar para sobreviver, enfrentando ao mesmo tempo a miséria e preconceitos que se geraram contra eles...
Estes monges eram descendentes e continuadores dos bravos homens que conquistaram Portugal. Sem as ordens religiosas e o seu papel social e militar através dos tempos, certamente não seríamos o que somos... eram as ordens religiosas que administravam os hospitais, as escolas, os campos... eram os ministérios da ciência, cultura, educação, saúde, agricultura, etc... o estado apenas geria as contas públicas e a guerra, tudo o mais era feito por esta gente de Deus... e foi um valha-me Deus para um enorme património histórico... desde então e até agora, como se pode ver pelas imagens desta reportagem que não conseguem fazer justiça a este pobre edifício...

Outra nefasta consequência deste decreto, foi o destino dado a todo esse património que de repente passou a estar à guarda do estado sem haver sequer preparação logística e administrativa. É que além das propriedades, não tinham contabilizado a quantidade de livros das inúmeras bibliotecas e todas as relíquias que os monges guardavam, eram vários séculos de arte e cultura que necessitavam de rigorosos cuidados de conservação e certamente deitaram a perder um valiosíssimo espólio histórico...
A história devia-nos contar lições para evitar cair nos mesmos erros dos nossos avós, mas a história é cíclica e repete-se, e o homem... esse não tem emenda...

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