sexta-feira, 18 de julho de 2014

Num País "civilixado", à beira mar arruinado.

 
Desde sempre que este projecto direccionou os seus esforços em denunciar os mais graves casos de lesa património, não distinguindo a índole de cada casa, uma vez que em todas as ruinosas ocasiões com que se deparou, qualquer uma por mais rica ou pobre que fosse, poderia ser contextualizada dentro de um ponto de vista patrimonial...
Já aqui abordei o património histórico, militar, nobre, urbano, clerical... mas por mais voltas que possa dar, nunca encontrei nada mais valioso do que o património humano e emocional.
Fui ontem, dia 17 de Julho de 2014, na boa companhia de um ruinoso colega, visitar e desbravar ruínas nunca dantes abordadas, visitámos dois palácios, uma escola, uma fábrica, uma quinta, dois chalets...e uma família.
 
Todo o eventual valor arquitectónico que estas casas possam ter, é largamente ultrapassado pelo valor das vidas que se podem perder por não terem outro sítio para viver.
É certamente um dos mais graves casos de lesa património com que me deparei em seis anos de dedicação a esta causa, um dos mais vergonhosos exemplos de degradação patrimonial, é o cúmulo do laxismo, uma vergonha nacional.
Como se pode encarar, ao abrigo da democracia conquistada em Abril, dos direitos humanos e da Europa civilizada, que ainda hoje haja casos desta gravidade?Como se pode encarar uma sociedade civilizada que é alheia aos mais básicos direitos de todos os seres humanos?  Como se pode admitir que haja uma frota automóvel de luxo, viagens e aquisições de carácter supérfluo, entre muitas outras gorduras do Estado, enquanto houver pobreza em Portugal?
Denunciei hoje esta situação a uma estação de televisão, e às entidades competentes... espero que acabem felizes e contentes.
Já anteriormente tinha fotografado o exterior da casa em questão, que pela sua traça arquitectónica me tinha chamado a atenção, prometendo uma futura intervenção para depois da operação, que durante algum tempo me deixou fora de acção.
De todas as estruturas que visitei, poucas posso enumerar em tão mau estado de conservação, em que uma eminente derrocada ameaça esta povoação e a via de circulação.
É preciso alguma coragem para nos introduzir neste interior, em que as desventradas salas e periclitantes paredes, com dificuldade e espanto para todos nós ainda se mantém de pé...
Foi uma loucura entrar nesta estrutura, foi mais um episódio desta ruinosa aventura, pois a nossa segurança e integridade, estiveram em causa nesta actividade.
Imediatamente percebemos que estava habitado, pelos vestígios que havia por todo o lado...
 "Ó de casa, está cá alguém?", assim gritámos ao entrar, logo e humildemente apareceu a Mingas e a Ângela, com um sorriso na cara, um brilho nos olhos em ambiente familiar.
Como se de um palácio se tratasse nos convidaram a entrar, mostrando-nos todos os cómodos do seu pobre lar.
Os dois gatos e o cão,  que com carinho partilham as vidas, deixaram as nossas emoções ainda mais enternecidas.
Também o Nuno, que desta família é filho e irmão,  partilha a habitação no único quarto com soalho, e se encontra acamado tendo sido vitimado por um acidente de trabalho.
Sem emprego, mas com esperança de uma vida certa,  vivem a realidade de uma ferida aberta, com a coragem e tenacidade que é necessária, esta família enfrenta uma intempérie diária...
Foi uma valiosa lição desta família feliz, que bate no coração de um arruinado País...

7 comentários:

  1. É deveras tocante, triste.

    O teu trabalho é incrível, consegues resgatar toda a beleza de uma ruína.
    Parabéns.

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  2. É deveras triste,
    uma familia em riste,
    em tal parca habitação
    que espécime me faz, tamanha confusão!

    No entanto temos fotografo pertinente,
    com uma Canon na mão e uma boa lente
    nos narra assim uma história tão humana, tão diferente
    ao acolherem-no assim só podem ser boa gente

    E lá vai Gastão de máquina em toda a parte
    sacando fotos e mostrando-as no Ruin'arte
    Foca alí, ficheiro RAW, retoca acolá
    imortalização para este homem, já!

    E aos poucos e poucos nos vai mostrando
    Casas, mansões, habitações que só em sonho ansiando
    Espalhadas por um portugal à beira mar plantado
    Com políticos inertes, com um futuro estagnado

    Paulo.

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  3. Tem um historial de trabalhos fantásticos, que denotam interesse evidente nesta temática. Não sei se já teve oportunidade de visitar as ruínas de Paços de Brandão, conhecida como Casa da Quinta do Engenho Novo e vulgarmente chamada Casa das Mil Portas. Penso que seria um trabalho de valor a juntar aos seus.
    Cumprimentos.
    Catarina Adão

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  4. Olá Gastão,
    Já há alguma notícia desde que publicaste estas fotos? :(

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  5. Conheci-o hoje através da tv, já a conversa ia a meio com a Conceição Lino. Não sei explicar mas sempre tive algum fascínio, por ruínas e sempre que tenho oportunidade fotografo também mesmo sem a qualidade, beleza, ângulo, técnica como gostaria. Para algumas pessoas (talvez muitas) é incompreensível este apelo, pelo que fiquei agradavelmente surpreendida com o tema da entrevista e do livro que vai apresentar este mês. Não podia deixar de o procurar na esperança de encontrar o blog. Não tenho palavras para demonstrar o que senti com as fotos que aqui vi. Apenas um muito obrigada pela partilha

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  6. Oi Gastão!!
    Eu moro no Brasil e achei muito interessante o seu blog. Eu quando miúdo, como vocês dizem, vivi em Portugal e também me lembro de algumas ruínas em Portugal e nos Açores. Tenho uma sugestão, eu penso que seria interessante ter um mapa do tipo Google Maps com os marcadores das ruínas fotografadas. Dessa forma poderemos ter a localização e distribuição geográficas exatas além observar as ruínas por imagens de satélite.
    Abraço e Parabéns pelo trabalho,
    Pedro

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  7. Como é possível que haja uma família a viver num espaço inabitável em mais de 90%? Uma existência quotidiana num edifício em tal estado, é decerto um permanente risco de vida!!! Todavia, vão levando a sua existência como podem... Situações destas fazem-me lembrar uma canção dos primeiros tempos dos Bee Gees: "Second Hand People" (1966).

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