Quando a incompetência e a prepotência se juntam numa junta, os resultados podem ser bizarros...
Pois é, uma vez mais o princípio de Peter mostra estar certo... "Num sistema hierárquico, todo o funcionário tende a ser promovido até ao seu nível de incompetência." ...
Este princípio foi formulado por Laurence Johnston Peter e tornou-se famoso, com a obra do mesmo título, publicada em 1969. Ou seja... mais cedo ou mais tarde irá parar um incompetente a um lugar chave, tal como acabei de constatar numa das minhas ruinosas aventuras...
O início desta história remonta ao principio do ano de 2010, quando pedi apoio à Junta de Freguesia de Marvila pela ocasião da exposição na Fábrica do Braço de Prata...
Uma vez que estava a fazer um levantamento do património arquitectónico e histórico dos bairros orientais de Lisboa, achei que deveria pedir apoio financeiro à Junta de Marvila. Estava no fundo a trabalhar no interesse dessa população... e por lá andei durante perto de três meses a palmilhar, fotografar, entrevistar, conhecer essa zona esquecida e empobrecida, que já teve um período de ouro...
Após algumas tentativas consegui ter uma reunião com o sr. Belarmino Silva, presidente desta instituição, que se revelou sensível ao meu trabalho e deu-me todo o apoio moral para esta demanda, prometendo-me levar à assembleia uma proposta de patrocínio para impressão de originais e molduras.
Deixei bem claro nessa reunião, que toda a colecção seria doada à junta para que pudesse ser distribuída oportunamente pelas várias colectividades. Seria um legado ao povo de Marvila em forma de arte e história... a única homenagem que lhes poderia prestar...
Aguardei dois meses e nunca mais obtive qualquer resposta, pois as assembleias são semanais e nunca mais a proposta era proposta nessa dita e bem dita assembleia... até que após várias tentativas, tive o primeiro contacto com o sr. victor morais (sim, em letra pequena), era o vogal da "coltura", que assegurava o bom funcionamento deste sensível pelouro...
A resposta não poderia ter sido mais incongruente... " A junta só patrocina projectos colectivos...!!, como tal, a nossa generosidade não pode contemplar o seu projecto..." , ao que respondi por escrito com todo o sarcasmo e sinceridade, que só por ter feito esta hercúlea tarefa, acabei por ter diversos papeis, mais que não seja "desdobrei-me em dois...e por isso é um projecto colectivo!!!
Adiantei também que não estariam a dar nada que não lhes fosse devolvido, ainda para mais enriquecido com todo o trabalho de fundo, e acabei a carta a pôr em dúvida toda a autonomia, inteligência e capacidade de soberana gestão, por excesso de zelo burocrático... enfim... uma pérola literária...
No dia seguinte, o meu amigo e co-expositor, Jorge Castro Henriques, reuniu-se com o presidente, e trouxe 300€ para cada um, o que permitiu adquirir molduras de clip e fazer ampliações em papel fotográfico 20x30cm... assim ajudaram a montagem da exposição... assim se cumpriu a prometida ajuda... e assim cumpri a minha promessa...
Quando desmontei a exposição, dirigi-me à junta com a colecção completa e encaixotada, são 56 fotografias emolduradas e devidamente identificadas, acompanhadas com textos de levantamento histórico da minha autoria. Falei com as secretárias e deixei bem claro que necessitaria de legitimar a doação com um documento apropriado, ao que me disseram desconhecer como se faria, pois nunca tal lhes tinha acontecido... "nunca nos deram nada... não sabemos como se faz"...
Não percebo lá muito de "burrocracias", mas sei que deve haver algures uma minuta , perdida num arquivo qualquer para ser consultada por qualquer outro "burrocrata"... era questão de se mexerem... até lhes disse que não seria necessária uma escritura, para mim bastaria uma simples carta assinada a acusar a recepção de todo o espólio, responsabilizando-se pela sua administração... era simples...
Falei com o sr. victor morais diversas vezes nesse sentido, e tive o privilégio de o ouvir em Julho último, apontando para o fim de Verão quando as coisas voltassem ao normal a concretização dessa formalidade... e desde então nunca mais consegui ter novamente o grande benefício da sua atenção... telefonei e deixei recado com todos os meus contactos algumas dezenas de vezes...
Até que perdi a paciência e exigi a devolução da colecção, dirigi-me à junta, não antes de ter telefonado e acordado que por lá iria passar, fiquei pasmado quando não me deixaram levantar a colecção, pois não se encontrava ninguém de momento que pudesse autorizar a entrega.
Ainda aguardei perto de uma hora pelas tentativas de contacto com alguém que o pudesse fazer... ao que me acabaram por dizer que o sr. victor morais poder-me-ia receber na quinta feira dentro do horário de expediente... o que me pareceu no mínimo, ridiculamente prepotente... é o cúmulo... ainda teria de me dirigir novamente à junta para lhe rogar cumprir o que se tinha acordado, ou para me devolver o que ainda era meu...
Respondi que me deveriam receber "de passadeira", pois fiz mais por eles culturalmente, do que o próprio executivo!!! Escrevi novamente ao sr. Belarmino Silva a delatar a situação e a exigir uma explicação e pedido de desculpas, até que fui novamente agraciado pela atenção do vulgar vogal...
"Era só para lhe dizer que pode vir buscar a sua colecção quando quiser..." - disse-me num tom soturno e deveras eloquente...- "é que aqui na junta não temos tapetes, verdes, vermelhos ou azuis... aqui é só gente simples e o sr. pensa que é doutor..."
Parece que o ofendi... coitadinho do egozinho pequenino desse senhor... EU, E TODO O POVO DE MARVILA É QUE FOMOS OFENDIDOS!!!!
Por todo o desprezo, por toda a inoperância e ignorância que demonstrou neste processo, por ter privado os marvilenses de terem acesso a um legado que lhes pertence, por ter deixado fugir uma colecção que pode ser avaliada numa pequena "pipa de massa"... enfim...
Nunca tive tantas dificuldades para oferecer alguma coisa na vida, nem nunca dei nada tão valioso como o meu trabalho e dedicação...
O meu pai chamava-lhes "IGNATRES"... são os ignorantes e atrevidos que diariamente conduzem Portugal à ruína...
Caríssimo amigo.
ResponderEliminarPercebo e assino tudo o que disse.
Há 8 anos que trabalho em Marvila e para Marvila. Conheci já 3 executivos na JFM e confirmo que os 2 últimos têm sido difíceis para a Cultura na freguesia. Tenho a meu encargo o único edifício classificado como IIP em toda a freguesia (o outro, que é MN, é apenas a galilé) e deparo-me com as mesmas dificuldades. Sou uma pessoa, mas represento uma instituição e o resultado é o mesmo. Reconheço a grande importância da Cultura popular, o mal é quando ela se torna apenas "coltura" e onde outras formas culturais não têm lugar nem apoio...
Nem mesmo há a delicadeza de resposta a convites formais...
Luís Proença
Pérolas a porcos! talvez devido a tanta ignorância que reina em Portugal, talvez 48 anos de ditadura e de obscurantismo das ideias. Fotografia? Ruínas? Cacarecos? Como podem compreender...tanto tanto para dizer...mas é o estado da Nação.
ResponderEliminarLeonor Vieira
Sou dos Açores e tomei conhecimento destes factos através do FaceBook, por onde cheguei ao blog. É realmente indigna a forma como amiúde se trata a cultura no nosso país. Agora, por favor, não continuemos a culpar a ditadura por todos os nossos males; ela acabou sim, o que não terminou mesmo foi o obscurantismo das idéias e a incultura de muito do nosso povo...por mais que se diga o contrário! E não por culpa da ditadura...
ResponderEliminarLuís Resendes
Esqueça lá isso...
ResponderEliminarO trabalho está muito bom.
Parabéns!
congradulations on your blog. it's very inspiring. i watch you over google reader and i sometimes reblog you on my tumblr blog which is about old buildings, reconstructions and adaptations. thanks to google translate i can read you.... maybe this is the way how can i manage to learn portugese :)
ResponderEliminari wish you all the best
Um episódio lamentável, para juntar a muitos outros que circulam por aí.
ResponderEliminarViva! Em primeiro lugar os meus parabéns pelo magnifico trabalho artístico por si criado, que apreciei ao vivo na Fábrica de Braço de Prata. Em segundo lugar Marvila é uma cidade dentro de outra cidade, com cerca de 60 mil habitantes, onde sou nado e criado, e onde incontável vezes fui tratado como uma espécie de delinquente cultural por este executivo. Não me admira nada o tratamento de "lixo", com que o contemplaram. Aqui, dentro deste executivo reina a cultura do pão e circo e do marialvismo. Marvila tem um jornal mensal, pois nunca neste jornal de caserna apareceu qualquer reportagem sobre a Fábrica de Braço de Prata ou o Teatro Meridional, que também reside na freguesia. O Teatro Meridional foi recentemente agraciado com o prémio europeu de teatro. Nenhuma das bancadas com assento na Assembleia de Freguesia propôs um voto de contentamento por esta companhia (presumo ser a única portuguesa que até à data o recebeu)ter sido contemplada com tão distinto prémio. Até sempre, com um fortíssimo abraço de: João Jorge Meirim (jj.meirim@clix.pt)
ResponderEliminarÉ assim...
ResponderEliminarPorque diabo inventaram a cultura?...
Não serve para nada...!
Que tristeza sinto destas situações, mas não me admira...!
Quando o património cultural é deixado cair por desleixo e se cortam verbas para a cultura o que se pode esperar?
A Luz a Sombra
Lamentavelmente, na dita Cultura do nosso País existe gente que talvez nem de Agricultura entenda!...
ResponderEliminarEsse teu Projecto é do melhor que tenho tido conhecimento nos últimos tempos, e quanto ao que sucedeu só tenho algo a dizer:
"Não se devem dar pérolas a porcos."
C.M.
Como sou funcionário público, embora não militante, enfiei um bocado chápeu na cabeça, mas ao mesmo ri-me sozinho com a sua narrativa.
ResponderEliminarUma coisa aprendi a fazer como funcionário, nunca vou a um serviço público sem telefonar antes. Por telefone consegue-se tudo.
Em todo o caso, as suas fotografias são mais uma vez devastadoras...
Caro amigo. Tenho seguido o seu blog que classifico de excelente. Pelo aspecto gráfico e pelo texto.
ResponderEliminarEsta é a primeira vez que o brindo com o meu comentário. É o mínimo que posso fazer perante a respectiva excelência deste espaço.
Mas vamos ao que interessa.
Esperar que gente sem cultura nenhuma, que usurpa lugares que deveriam pertencer a gente com cultura, lhe responda sobre qualquer assunto que respeite à cultura, é no mínimo querer partir pedra com a cabeça.
Espero sinceramente que este episódio lhe tenha servido de lição.
Portugal está moribundo. Cheira mal. E ainda não morreu porque ainda definham por cá alguns portugueses verdadeiros como o meu caro e eu.
Para a próxima experimente levar a caçadeira. Deite uns tiros para o ar e vai ver que até lhe dão senhas para o metro.
Fala-se muito na ditadura que passou. Foram 50 anos, dizem. Não se fala nesta ditadura de partidos e seus bossais. E já lá vão quase 40.
Desculpe por lhe tomar o seu espaço.
Continue o seu excelente trabalho.
Vou ser sempre o seu atento leitor.
Que pena não me sair o euromilhões...!
Parabens pelo seu trabalho fotografico, estao lindas as fotos, quanto às suas descobertas dos meandros estatais so posso dizer que nao posso estar mais de acordo consigo.
ResponderEliminarDesejo-lhe força e inspiraçao
Meu caro amigo Gastão,
ResponderEliminarApenas comento este post para te deixar a minha solidariedade por teres que lidar com gente deste tipo à frente dos destinos da nossa "coltura".
Ah, e deixa-me dizer-te que registo desde já aqui a minha disponibilidade para ficar no minimo com uma moldura da colecção!
Eles não querem... mas eu quero!!! :)
Um grande abraço
Parabéns pelas fotografias, muito bem conseguidas.
ResponderEliminarQuando à "aventura" por meandros da junta, infelizmente é um espelho não só da Junta de Freguesia de Marvila mas da esmagadora maioria das juntas do país, existem excepções, é certo, e nem toda a gente que trabalha nas juntas tem a mesma atitude, mas parece-me que que tem o poder decisivo dentro das mesmas não faz mais que verificar se entrou o vencimento ao fim do mês com tudo o que têm e não têm direito...
Os meus parabéns pelo excelente trabalho do melhor que já vi. E se me permite uma pequena ideia porque não colocar todas essas excelentes fotos em exposição em cafés , restaurantes e lojas de Marvila . Eu pelo menos se tive-se lá um negocio era com prazer que tinha exposto o seu fantástico trabalho .
ResponderEliminarUm abraço
Oscar
Tienes una colleccion impressionante de ruinas. Yo estuve solamente una vez en Portugal y vi tantas ruinas y edificios abandonados. Es el paraiso para todos los aficionados de ruinas, para otra gente es probalemente bastante duro ahora.
ResponderEliminarMeu amigo, aprecio muito, mesmo muito, a qualidade do teu trabalho, a tua dedicação, a tua persistência...
ResponderEliminarSabes como é, este país ainda têm muitas cabeças pequenas, mesmo muitas, esta tua história apenas ilustra mais um desses miseráveis episódios que fazem de nós um povo minúsculo no contexto mundial.
Já agora, curti especialmente a passagem do teu texto «por ter feito esta hercúlea tarefa, acabei por ter diversos papeis, mais que não seja desdobrei-me em dois...e por isso é um projecto colectivo»
HehehHe ;D
Acrescento que na maior parte das vezes tu infelizmente encontras graffiti de péssima qualidade, o que naturalmente não é culpa tua. São habitualmente inscrições nas paredes que facilmente podem ser apodadas de vandalismo. Mas na primeira fotografia desta série tu tens, no canto inferior esquerdo, um lettering inconfundível do HIUM, que é um artista de mão cheia. Também ele, como tu, já teve trabalho exposto na Fábrica do Braço de Prata, integrando a VSP (Visual Street Performance). Ele tem um estilo arredondado, as letras parece que são nuvens :)
Tu continua no teu bom trabalho!
Sempre em frente! ;)))
abraço :)
Olá,
ResponderEliminarDaqui um muito obrigada como cidadã, e a certeza que esse espólio não se vai perder. Unamo-nos! Criemos nós um arquivo, um centro de documentação sobre Património. Mas antes, expô-las, de preferência num centro comercial (ex. praça central do Colombo) porque quanto mais gente vir isto melhor, trata-se afinal de sensibilização, não importa o meio.
Vim ao blog à procura de outras fotos e "tropecei" neste post. Pois é, assim é mais difícil fazer qualquer coisa pela nossa cultura. Com pequenos ditadores prepotentes e burros como o senhor vogal da JFM ainda pior!!! Provavelmente ele não sabe que enquanto órgão do poder local a JF não pode receber doações sem que leve a proposta à Assembleia de Freguesia. Essa sim pode deliberar a aceitação. Parabéns pelo excelente trabalho e paciência!!! (Vou continuar a minha procura)
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