domingo, 30 de dezembro de 2012

O Castelo da D. Chica - Palmeira - Braga

Foi mais uma ruinosa aventura há já muito desejada, pois este edifício constitui um dos mais faustosos e magnificos exemplos da arquitectura arte nova jamais construídos.
Tive ainda o privilégio de ser acompanhado por três novos amigos, que além da fotografia e das ruínas, cultivam valores cada vez mais raros nos dias de hoje, o que enriqueceu em muito o meu património emocional.
Não me vou desta vez debruçar muito sobre a história deste edifício, nem tampouco na sua arquitectura, pois estas descrições podem ser encontradas com facilidade neste mundo cibernético e estaria a plagiar ou reescrever tudo o que já foi dito e escrito.
Embora esta magnífica estrutura seja de um invulgar valor arquitectónico, e tenha sido traçado por um dos mais prestigiados arquitectos do seu tempo, Ernesto Korrodi, é um "elefante branco" que mancha a nossa história e reputação como povo civilizado.
O Castelo da D. Chica, não é propiamente uma ruína embora para lá caminhe. É sim, um desafortunado e devoluto edifício que espelha um espirito bem lusitano que o vitimou pela megalomania, pela burocracia, pela especulação e novo-riquismo.
Ao observarmos o seu breve percurso de quase cem anos, aqui encontramos vários erros humanos que o condenaram, tornando-o num belíssimo exemplo da crise que assola o nosso amado e abandonado País.
Foi edificado nos "Gloriosos anos da Grande Guerra", conforme uma inscrição sobre a sua nobre entrada, obedecendo a um caderno de encargos em que nenhum gasto foi poupado, pois estava em jogo o ego da sua rica proprietária, a famosa D. Chica, herdeira de uma grande fortuna brasileira, que o idealizou para as suas faustosas festas e fantasias.
Em 1919, pela separação do seu marido, casou com o amante de quem teve um filho, tendo sido o projecto nessa altura abandonado. Mais tarde voltou para a sua terra natal, onde veio a falecer já na década de 1960.
Mudando várias vezes de mãos, o castelo nunca foi devidamente acabado, pois as infindáveis burocracias e entraves autárquicos com que se depararam os seus proprietários, deitaram a perder esta jóia de arquitectura, impedindo o seu progresso como "Mansão Filosofal", logrando as nobres intenções de cada um dos frustrados donos.
Como sabemos, um edifício desta índole é essencialmente valorizado pela riqueza e acabamentos do seu interior, sobrepondo-se muitas vezes à exuberante fachada.
Tanto quanto se sabe, este era rico em madeiras, estuques, vitrais, ferragens, azulejaria, estatuária, cantarias e outros itens de grande valor artístico que o tornavam num valioso tesouro da autoria dos melhores mestres de cada ofício.
Foi mais tarde em 1990, adquirido por um valor simbólico pela junta de freguesia local, que cedeu quase de  imediato a sua exploração a uma empresa do ramo hoteleiro, a IPALTUR, num contrato que claramente favorecia esta entidade em prejuízo da autarquia, em que o compromisso das obras de "requalificação" e aproveitamento cultural lhe conferiram inexplicáveis regalias.
Aquando da última intervenção que o transformou num suposto investimento turístico, todo o seu interior foi desventrado para fazer uma discoteca, com restaurante, salas de congressos e reuniões, tendo sido completamente desvirtuado de todo o seu explendor.
Após as ditas obras não restaram sequer vestígios do seu primitivo projecto, todo este espólio se perdeu para sempre, inclusive os planos originais...
É caso para indagar, onde estavam os zelosos autarcas que em dada altura impediram a continuação do projecto inicial?
Como foi possível tão grande barbárie que matou este belo edifício e empobreceu todo o País?
Creio que nem um chimpanzé autista seria capaz de licenciar um projecto tão condenatório no ponto de vista moral e patrimonial, quanto mais doutores, engenheiros e outras pardas sumidades autárquicas e governamentais...
Embora o Castelo da D. Chica tenha sido reconhecido em 1985 como Imóvel de Interesse Público, não houve nenhum impedimento em realizar tamanha e tacanha obra de vandalismo e de lesa património, como se pode concluir pela devassidão de tão valioso espólio, e pelas licenças necessárias e concedidas pelas diversas entidades (in)competentes...
Alguém deveria pagar bem caro por abuso de poder ou por negligência...e quiçá, corrupção!!!
Noutro País seria feita uma rigorosa investigação a todo este processo, codenando com justiça todos os intervenientes, fazendo deles um exemplo para todas as gerações futuras...
Poderemos também, e a avaliar pelo seu curto percurso de vida, que houve gestão danosa, pois os processos em tribunal por falta de pagamento, levaram muitos fornecedores ao desespero e enterraram bem fundo qualquer hipótese de revitalizar este empreendimento que animava as noites bracarenses.
Muitas vezes estes projectos de sucesso imediato, criam a ilusão de uma alegada falsa fortuna que é depauperada por níveis de vida exorbitantes e sinais exteriores de riqueza entre outras futilidades, não antevendo um declínio natural do negócio, pelo facto de simplesmente passarem de moda.
É igualmente difícil de entender porque é que esta propriedade foi  hipotecada por essa empresa com o acordo do seu legítimo proprietário (Junta de Freguesia), para cobrir as dívidas a inúmeros fornecedores da concessionária, tendo apenas a CGD sido a única ressarcida dos valores acumulados pela aquisição do imóvel...
 
Nem o negócio da Bragaparques com a permuta de terrenos em Lisboa foi tão mau e lesivo, há que tirar o chapéu a estes negociantes e advogados que conduzem o País à ruína ficando impunes...
O castelo encontra-se hoje à venda pela módica quantia de 2.5 milhões de euros, o que é mais uma grave situação de especulação imobiliária digna de um país do terceiro mundo...
Quem quiser investir num imóvel deste calibre, encontrará em França castelos à venda por menos de metade do preço com o dobro das condições, o que nos leva a pensar uma vez mais na pequenez e na megalomania do nosso mercado imobiliário.
Enquanto isso, a D. Chica-ca assustou-se-se perante este rocambolesco cenário e certamente andará às voltas no seu túmulo, enquanto o seu gato berrará: Isto é o cúmulo!!!

19 comentários:

  1. Parabéns pelo artigo em defesa do património assente em fotos que nos dão de facto a grandeza da Obra e a Pequenez das Gentes com responsabilidades principalmente autarquias, imobiliárias, bancários,cultura,...gentes que correm atrás do lucro fácil, sem trabalho.

    ResponderEliminar
  2. Uma grandes obras de um dos mestres da arquitectura revivalista da viragem do século XIX-XX - o arquitecto luso-suiço Ernest Korrodi ... que a projectou possivelmente durante a sua estadia em Braga, como professor na Escola Industrial de Braga.

    ResponderEliminar
  3. Este castelo é fabuloso!
    Foi "discoteca" quando andava na Universidade.
    Um dia acordei com a notícia que o Quim-Zé tinha morrido.. ao vir de lá...
    Um beijinho aos três - tão novos - vindos de um lugar tão....
    Um abraço!
    e um 2013 BOM!!!!!!! cheiode Luz e harmonia!
    MSK

    ResponderEliminar
  4. O prazer foi todo nosso (acho que posso falar pelos três).
    Em Janeiro retomamos as aventuras ruinosas.
    Tem um excelente 2013!
    A propósito: grandes fotografias ;)

    ResponderEliminar
  5. Adorei esse castelo!

    Contém uma fascinante beleza que nem por séculos irá desaparecer..

    Fabuloso fotoreportagem!

    ResponderEliminar
  6. Nas suas memórias, a certa altura da narrativa, a Margueritte Yourcenar visita uma antiga mansão familiar, que segundo ela teve o melhor destino a que uma antiga casa pode aspirar, foi transformada em biblioteca pública. E quando hoje vi a sua magnífica reportagem deste castelo de fantasia, só pensei nas palavras da Yourcenar.

    Não haveria um destino mais digno para este chalet acastelado do que uma discoteca? Certamente que em Braga haverá serviços culturais, como arquivos, bibliotecas, museus ou galerias de exposições temporárias a precisarem de um espaço, para não falar de associações culturais.

    Ainda bem que o Gastão está cá para denunciar estes atentatados

    Abraços

    ResponderEliminar
  7. Obrigado pelo seu notabilíssimo trabalho de divulgação e denúncia.
    Que 2013 traga melhores notícias sobre o nosso Património.

    Saudações!

    ResponderEliminar
  8. A chaque fois que je passe devant je ressent une émotion inexplicable devant cette architecture .
    Bravo pour cette article

    Elisabeth

    ResponderEliminar
  9. Sou de Braga e é impossível ficar indiferente a edifício destes....
    No entanto a historia sobre o mesmo não esta correcta, nunca ninguém morou la, e quando supostamente abriu, foi com um local de eventos que fechou pouco tempo depois porque o homem que reuniu o dinheiro para empreendimento desapareceu do mapa junto com o dinheiro...

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Queira realizar um trabalho de video, e este seria o local ideal. Com quem deverei falar, para conseguir uma autorização

      Eliminar
  10. Belo texto e lindíssimo castelo. Infelizmente as belas e coloniais construções no Brasil, são tratadas com igual descaso, abandono e indiferença.

    ResponderEliminar
  11. e aberto ao publico o castelo? adora visitar! :) grande reportagem parabéns :)

    ResponderEliminar
  12. Adorei a fotoreportagem! E é lamentável o trato que o nosso país dá a obras magníficas, onde este castelo se inclui.

    ResponderEliminar
  13. Excelente reportagem. O problema é muito fácil de resolver. Identificar quem na câmara autorizou o que se passou, provavelmente os apelidados "engenheiros" que quando Mesquita Machado saiu não mais lhes restava d acompanharam-no. Depois comparem os ordenamos deles com os bens que possuem e s vida que fazem. Já agora até se pode tentar que um hacker veja as contas que têm na Suíça ou no Brasil, e está feito. Se s justiça nada fizer, fazemos nós,o povo

    ResponderEliminar
  14. Excelente reportagem !Pena que continue na mesma

    ResponderEliminar
  15. Vamos ser honestos. Este edifício não tem história alguma ou valor patrimonial. É fruto única e exclusivamente de um novo riquismo parolo e megalómano.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Pois o meu amigo engana-se... este edifício é de uma riqueza patriomonial imensa. A sua traça corrobora-o sendo uma obra de Korrodi. É um edifício único e deveria ter sido protegido, seria a maior atracção turística da zona, traria riqueza e emprego, dinamizaria a sociedade.

      Eliminar
  16. É demasiado grave o que vem ocorrendo desde 2013 aproximadamente, com os destelhamentos cada vez mais e mais e o abate de árvores da mata envolvente. Não deixa de surpreender a desfaçatez de um proprietário que comprou este imóvel em fase de classificação, ignorando ou confrontando o que estava em causa (por ignorância, mau aconselhamento, malvadez, vingança ?!) e os silêncios e morosidade das entidades que o deveriam proteger segundo a lei do património: Câmara Municipal de Braga (de MM e de RR), Direção de Cultura do Norte/Ministério da Cultura.
    Este belo e paradigmático imóvel, um ex-libris das cerca de quatrocentas obras que Ernesto Korrodi dotou e enriqueceu este país, ficou particularmente protegido desde, pelo menos, 1986, aquando da homologação do pedido de classificação (pedido feito pela Junta de freguesia da época, liderada por Manuel Vieira) e mais ainda em 2013 (8 de março) aquando da classificação como Imóvel de Interesse Público (MIP). Mas o enquadramento legal de proteção tem sido, neste caso, como se quase não existisse! Mas estamos certos de que, com mais ou menos ruína, o Palácio D. China sobreviverá à arrogância, ignorância e malvadez do atual proprietário e de uma administração pública semi-amorfa, semi-inativa como tem sido!
    Abaixo o terceiro-mundismo de um e de outros!
    Viva o património como riqueza artística e potencial económico tão essencial ao desenvolvimento do País!

    ResponderEliminar

LinkWithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...